segunda-feira, 31 de março de 2008

Oriente Médio

Dia da Terra na Paulista
Ali El Khatib*
Centenas de pessoas participaram ontem da manifestação para comemorar o Dia da Terra e em solidariedade ao povo palestino.O ato aconteceu, mais uma vez, na Avenida Paulista, com representantes de entidades que fazem parte do Comitê de Solidariedade aos Povos Árabes. Militantes da Cut, MST, Fepal, Instituto Jerusalém do Brasil, MOPAL, Instituto da Cultura Árabe, além de partidos políticos, e sheiks de diferentes mesquitas, refugiados palestinos acolhidos em Mogi das Cruzes, jovens e crianças.A concentração se deu na Praça Osvaldo Cruz, no Paraíso e caminhou, sob proteção policial, até o Prédio da Gazeta. No trajeto muitos oradores fizeram uso da palavra, entre eles o Deputado Jamil Murad.As palavras de ordem se fixaram no apoio ao povo palestino, no final do cerco a Gaza, contra o genocídio palestino, contra o holocausto e o muro do apartheid.Houve protestos também contra o tratado de livre comércio entre o Mercosul e Israel.O encerramento se deu nas escadarias da Gazeta com novos pronunciamentos e uma roda de "dabque" com músicas palestinas de protesto.

*Ali El Khatib é diretor do Instituto Jerusalém

Mídia amestrada brasileira é omissa sobre Mundo Árabe
Leila Bacha
A foto que aí vai é deveras impressionante, dentre outros motivos, porque, embora seja imagem oferecida pela Associated Press, NÃO FOI PUBLICADA em nenhum grande jornal brasileiro. Leitores brasileiros que paguem para ler OS TRÊS MAIORES JORNAIS BRASILEIROS (O Estado de S.Paulo, a Folha de S.Paulo e O Globo) e que assistam à Rede Globo de televisão, (por exemplo) sequer foram informados sobre esta reunião da Liga Árabe, ontem, em Damasco, Síria. Na 'grande' mídia brasileira, ontem foi dia de Faustão, de Tibet, e de Fantástico. Os 'grandes' jornais 'noticiaram' que o governo Lula teria decidido 'esfriar' Dilma Roussef... como se algum grande jornal brasileiro tivesse qualquer credibilidade para declarar 'intenções' do governo Lula. Não há, no mundo, jornalismo pior que o jornalismo brasileiro - seja na cobertura nacional seja (e, então, a calamidade é TOTAL), na cobertura de política internacional. Felizmente, no século 21, a Internet nos salva de todos estes DES-jornalismos, 'jornalismo' insuficiente, precaríssimo.Em texto publicado ontem pela Rede Al-Jazeera (em http://english.aljazeera.net/NR/exeres/DC25ECA3-AB0E-4460-A829-1CE3002D5711.htm, com a foto acima), afinal, pode-se saber dos eventos desta reunião da Liga Árabe (que existe desde 1945). Em 2008, apenas cerca de 10 das 22 nações que compõem a LEA reuniram-se em Damasco, e mesmo estas fizeram-se representar por "delegações pouco expressivas, de funcionários de médio escalão". O Líbano, por exemplo, sequer mandou representante e está ostensivamente boicotando a reunião. Muitos especialistas têm atribuído o boicote à influência dos EUA sobre seus satélites no mundo árabe. Outros culpam o Irã.Observadores da história do mundo árabe têm repetido que o Oriente Médio está paralisado numa encruzilhada perigosa: “O processo de paz entre Israel e palestinos permanece paralisado ou impenetrável; organizações que defendem os direitos humanos denunciam que a população de Gaza está à beira de colapso total, por causa do bloqueio imposto pelos israelenses. E o confronto armado entre Fatah e Hamas também têm imposto sacrifícios à população civil. (...)”.Muammar Gaddafi, presidente da Líbia, perguntou, com clareza de sol do deserto: "Como é possível que tenhamos aceito que um exército estrangeiro tenha deposto um líder árabe, com todos nós na platéia, assistindo pela televisão?!"Lembrou que Saddam Hussein, presidente iraquiano enforcado, com execução exibida pela televisão, também havia sido importante aliado de Washington, "e os americanos, depois, o abandonaram"."Vocês são os próximos da lista!" - disse Gaddafi, para uma platéia que se dividiu entre olhos esbugalhados de susto e algumas risadas, interpretadas por muitos observadores como "risos solidários".Mas Ahmed Bin Hali, alto funcionário da Liga Árabe, baixou o tom dos comentários e lembrou que sempre houve divergências políticas entre os árabes. "Os árabes, hoje, em ação coordenada com o governo do Iraque, devemos abrir negociações com os EUA, incluindo entre os negociadores a Turquia e o Irã, para cuidarmos, nós mesmos, de estabilizar o Iraque", disse ele a Al Jazeera.O mundo árabe pode estar sendo novamente reunido por obra, também, de uma mídia transnacional, possibilitada pela rápida evolução da tecnologia das comunicações. A mídia pan-árabe, transnacional, tem criado plataformas de diálogo e de compartilhamento de experiências que, afinal, podem estar reaproximando os árabes.Construindo uma linguagem comum e partilhando tradições diferentes, todos os povos do mundo árabe estão conseguindo construir condições de diálogo impensáveis há apenas uma década. A proliferação de veículos de informação independente tem levado informação de melhor qualidade a todo o mundo, quase em tempo real. O público, no mundo árabe têm sido informado sobre realidades que, antes, jamais viram televisionadas ou relatadas. A união dos árabes pode, afinal, estar renascendo, graças, sobretudo a televisões e redes de Internet que escapam, sim, à uniformização construída pela chamada 'grande mídia' norte-americana.

Leia estas e outras matérias importantes no excelente “Blog do Bourdoukan”. O endereço é: http://blogdobourdoukan.blogspot.com/

Para melhor compreensão sobre o que disse Kaddafi, não deixe de ler o artigo que escrevi para o semanário Jornal Opção On-Line, sobre o enforcamento de Saddam e a questão humanitária:

A forca e a questão humanitária

Tudo bem! Saddam Hussein foi finalmente enforcado. Está morto e enterrado. Com direito a vídeo vazado pela CIA e tudo mais. Foi condenado por crime contra a humanidade pelo massacre de 148 aldeões xiitas da localidade de Dujail, mortos em represália do então presidente iraquiano ao atentado que sofreu pelos mesmos xiitas em 1982. Tentaram matar Saddam. Mas Saddam foi mais esperto. Matou-os primeiro. E fez isso com armas químicas que também utilizou contra curdos e outros desafetos. Armas químicas, aliás, fornecidas ilegalmente pelos EUA quando os “humanitários” ianques viam ainda com bons olhos o então aliado Saddam Hussein como “um muro civilizatório no Oriente Médio contra a barbárie xiita do Irã”, segundo palavras de nada menos do que Dick Cheney, então secretário de Defesa durante a administração de Bush pai. Mas o que chama atenção é o fato de que Saddam foi enforcado por ter matado xiitas, mas não por ter também massacrado separatistas curdos do norte do Iraque. Não o foi por uma razão simples: se o tivessem condenado por causa dos curdos, teriam problemas com a Turquia, aliada da Otan. Isto porque a repressão turca aos curdos em território turco, na década de 90, foi — e continua sendo — extremamente violenta e sistemática. De 1990 a 1994, à medida que o exército turco estava devastando as áreas rurais do sul do país, além de centenas e centenas de mortos houve a fuga de cerca de um milhão de curdos do campo para a capital oficiosa curda, Diyarbakir. O ano de 1994 conheceu dois recordes: foi “o ano da pior repressão nas províncias curdas” da Turquia, como o repórter Jonathan Randal relatou do palco dos acontecimentos, e o ano em que a Turquia se tornou “o maior importador individual de equipamento militar estadunidense e, assim, o maior comprador mundial de armamentos”. Quando os grupos de direitos humanos denunciaram o uso pela Turquia de jatos fabricados nos Estados Unidos para bombardear vilarejos, segundo o intelectual Noam Chomsky, “o governo Clinton achou maneiras para contornar as leis que requerem a suspensão das remessas de armamentos, como também fez na Indonésia e em outros lugares”. Houve alguma ação “humanitária” contra a Turquia, membro da Otan? Evidentemente que não. Outra questão importante: se o motivo pelo qual Saddam foi enforcado servir de exemplo para os Estados nacionais que têm problemas com forças separatistas — e que vêm atuando de uma forma firme, e até violenta, para reprimir tais tendências —, faltarão carrascos no mercado. Haja vista os russos com a questão da Tchechênia, os espanhóis com os bascos, os ingleses com os irlandeses, o separatismo dos norte-italianos, os afrancesados de Quebec, no Canadá, os curdos na Turquia, a Kashemira, na Índia, ou o Tibet, na China. Curioso imaginar, também, o que teria sido do orgulho e da história norte-americana diante de uma hipotética “intervenção humanitária” na Guerra de Secessão no século XIX, com seus mais de 500 mil mortos e milhares de feridos. Foram 500 mil mortos em decorrência da atuação dos ianques para evitar que acontecesse com os Estados Unidos o que separatistas xiitas e curdos tentaram fazer no Iraque. E se hoje a Flórida tentasse se separar dos Estados Unidos? O que aconteceria? Se o Rio Grande do Sul ou a Bahia tentassem a secessão do Brasil? Isso seria admissível? Não. Seria a guerra civil. A federação brasileira é uma causa pétrea da Constituição e, por força da lei maior e imperativo moral, o Estado brasileiro seria obrigado a reprimir tal intento. Mas o problema — e a justificativa do enforcamento — é a “questão humanitária”, o conceito de crime contra a humanidade. Foi justamente por esta idéia que também tentaram enquadrar Milosevic na questão iugoslava. O “direito” de “intervenção humanitária”, em que se basearam os Estados Unidos e a Otan em Kosovo, foi uma questão tão humanitária, mais tão humanitária, que justificou a utilização de arsenal radioativo sobre populações civis na Sérvia, a despeito de qualquer autorização por parte do Conselho de Segurança, num flagrante desrespeito ao direito internacional. Esta não é uma desculpa nova. O acadêmico Sean Murphy, em trabalho que historia a evolução dos intervencionismos militaristas desde o Pacto Kellogg-Briand, de 1928 (que colocou a guerra fora da lei), até a Carta da ONU, mostra os exemplos mais destacados de “intervenção humanitária” ao longo dos últimos 80 anos: o ataque japonês à Mandchúria; a intervenção de Mussolini na Etiópia e a ocupação nazista em regiões tchecoslovacas. Todas, ações bélicas violentas, acompanhadas sempre de um discurso humanitário exaltado e bem- elaborado. Os nipônicos iriam defender os mandchus da “crueldade bárbara” dos chineses; Mussolini lutava para libertar milhares de escravos etíopes de “seu próprio atraso”, numa “missão civilizadora”, e Hitler proclamava, em artigos inflamados nos principais jornais ocidentais, a necessidade de intervenção germânica para acabar com “a violência e genocídio tchecoslovacos contra populações alemãs” dos Sudetos. O enforcamento de Saddam, portanto, merece uma reflexão importante para o Brasil, principalmente quando sabemos das preocupações humanitárias e altruístas dos países hegemônicos com relação aos nossos índios, animais e plantas.

SAID BARBOSA DIB, historiador e analista político, reside em Brasília.

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