sábado, 30 de agosto de 2008

Brasil

Foto de Manuela Limongi Lagares Dib
Venda de ações pode ser armadilha
Rui Nogueira

O caminho da privatização dos serviços públicos, principalmente os essenciais, que deveriam permanecer com gestão comunitária, passa pela venda de ações em bolsas estrangeiras. É difícil entender ou encontrar alguma vantagem para a população, um serviço público destinado a atender uma necessidade fundamental, como o abastecimento de água, ser entregue a uma concessionária estrangeira, que só almeja auferir grandes lucros.
Os exemplos desta estratégia são tenebrosos. A Copasa, empresa de águas e saneamento de Minas Gerais, colocou cerca de 30% de suas ações nas mãos de acionistas estrangeiros. Logo abandonou o objetivo de prestação de serviços à população mineira, para a qual foi criada por lei, ao declarar em seus relatórios contábeis, publicados em jornais de MG, que tem o objetivo empresarial de produzir resultados financeiros. De empresa de prestação de serviços virou empresa financeira, hoje 74% estrangeira.
Para atender aos interesses gananciosos dos acionistas estrangeiros a empresa mineira (Copasa) instituiu tarifas muito altas, até cinco vezes as praticadas pelos serviços que permaneceram municipalizados, passou a condicionar as ligações de água (bem essencial à vida) ao retorno financeiro, além de exagerar na cobrança pelas ligações.
O resultado nefasto está manifesto nos relatórios financeiros (balanços anuais), em que se vangloria de crescente envio de "resultados" para acionistas estrangeiros (2003, 400 milhões; 2004, 466 milhões; 2005, 586 milhões; 2006, 658 milhões), sob a forma de ebidta, que é o envio de resultados antes de qualquer pagamento.
Agora, há poucos dias, o governo de MG anunciou a assinatura de um acordo com o governo espanhol para que ele realize todos os estudos das bacias hidrográficas mineiras, em especial na região nordeste do estado. Como pode o governo de MG delegar para estrangeiro o que é sua obrigação fundamental?
Com a Sanepar, no Paraná, a venda de ações em 1998 encontrou, agora, patriótica reação do governo do estado. Como uma legitimação de absurdo, tinham votado uma autorização legislativa, em 8 de junho de 1998, que permitiu o Estado do Paraná alienar 39,71% das ações ordinárias para a Dominó Holdings SA., da qual fazem parte o grupo francês Vivendi, denominado Sanedo (Nestlé é do grupo), a construtora Andrade Gutierrez (ligada ao Banco Mundial), o Banco Opportunity (ligado ao City Bank) e a Copel Participações. Mesmo minoritários, acordos de acionistas permitiram o controle da Sanepar para desviá-la de sua função social e ampliar lucros. A recuperação do controle pelo Estado do Paraná só foi conseguida, há pouco, na Justiça.
A mais fundamental função dos governos está em atender as necessidades básicas das populações, o que coloca a estratégia de vendas de ações e privatizações de serviços essenciais em xeque. Prestar serviços para o bem-estar da população é meta absoluta e prioritária, incompatível com a presença de consórcios estrangeiros exploradores.
Precisamos ficar alertas contra a intenção do governo do Estado do Rio de Janeiro de vender ações da Cedae, cujos funcionários construíram a maior estação de tratamento de água do mundo e agora vêm os serviços serem terceirizados, com vigilantes transformados em administrativos, verbas contigenciadas e diminuição dos funcionários, o que sobrecarrega os remanescentes e diminui a qualidade dos serviços, numa sórdida política de querer justificar uma privatização que em todos os lugares do mundo sempre é prejudicial para a população.
Será que vamos admitir para a água o absurdo caminho da distribuição de energia, entregue a uma concessionária estrangeira (Ampla) e que teve a causa de suas contas absurdas revelada por CPI da Alerj sobre as medições, quando foi demonstrado serem fraudulentas. (Não foi processada?) Alerta! As transnacionais não querem o nosso bem. Querem os nossos bens!!!
É bom lembrar que alguns políticos facilitam as privatizações porque empresa estatal não pode financiar campanhas partidárias, mas as empresas privadas, por lei, podem fazê-lo.
Trinta anos de concessão com isenção de impostos garante financiamento de campanha por oito legislaturas. Os "facilitadores" elegerão os netos!
Resistir é preciso.

Rui Nogueira é médico, pesquisador e escritor rui.sol@ambr.com.br

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